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Identificando aves: ferramentas no combate ao tráfico de animais silvestres

Quem é essa ave?

Identificar uma ave nem sempre é uma tarefa tão fácil se você não é uma pessoa adepta aos avistamentos de aves (birdwatching), nem um(a) estudioso(a) da área. No seu dia a dia, saber diferenciar tiriba-fogo, papagaio-verdadeiro e periquito-de-encontro-amarelo ou saber onde essas espécies ocorrem pode não ser trivial ou relevante, mas essa identificação técnica e precisa é fundamental para atuar no combate ao tráfico de aves no Brasil. Nesse texto, apresentamos um guia importante para auxiliar profissionais que atuam no combate ao tráfico, o papel ecológico da avifauna e formas de conhecer as aves sem contribuir para a retirada de animais silvestres de seus habitats naturais.

 

Aves: as principais vítimas do tráfico de animais silvestres no Brasil

O Brasil é um dos países com a maior diversidade de aves do mundo, abrigando 1.971 espécies, segundo o Comitê Brasileiro de Registros Ornitológicos (CBRO). A riqueza da avifauna brasileira, no entanto, é um dos principais alvos do tráfico de animais silvestres no país. Essa atividade, apesar de ilícita, continua existindo porque há demanda, especialmente para consumidores que desejam ter esses animais como pets, atraídos pela beleza das plumas, pela melodia do canto, pela inteligência e capacidade que algumas aves possuem de imitar sons, entre outros fatores. Um estudo realizado por Alves et al. (2013) traz um panorama dessa realidade brasileira e revela que cerca de 295 espécies de aves são comercializadas ilegalmente como animais de estimação no país, mas, com base nos dados levantados, as estimativas chegam a mais de 400 espécies.

Devido à intensa retirada de animais da natureza para movimentar o tráfico de animais silvestres, os Centros de Triagem de Animais Silvestres (CETAS) e outros centros de resgate, triagem e reabilitação recebem frequentemente aves apreendidas ou que foram entregues pela população de forma voluntária, o que resulta na sobrecarga dessas instituições, que acabam operando em sua capacidade máxima.

Agentes fiscalizadores se deparam com situações que envolvem aves vivas em seu cotidiano e, portanto, precisam de respostas rápidas e técnicas para garantir a destinação correta e o bem-estar desses animais. Nesse cenário, materiais como o Guia de Identificação de Aves Traficadas no Brasil (Costa & Monteiro, 2016) são ferramentas importantes para a proteção da avifauna. Além de útil para profissionais que atuam com o combate ao tráfico de fauna silvestre, o material é um recurso didático que pode orientar a população de modo geral sobre as ameaças às aves, ao mesmo tempo que apresenta as características físicas e ecológicas das espécies, difundido o conhecimento sobre a avifauna brasileira.

 

Guia de Identificação de Aves Traficadas no Brasil

O Guia de Identificação de Aves Traficadas no Brasil foi criado com o objetivo de auxiliar autoridades ambientais, policiais e profissionais de conservação na identificação rápida e precisa das espécies de aves mais traficadas no país. O guia oferece descrições sobre 186 espécies de aves, escolhidas com base em levantamentos de casos reais de apreensões e dados disponíveis na literatura, com fotografias, informações sobre características morfológicas e a distribuição natural dessas espécies. Além disso, o material traz importantes reflexões que devem fazer parte das etapas de planejamento das ações de fiscalização, desde procedimentos gerais até a forma correta de captura, destinação e transporte dos animais, para facilitar a tomada de decisão e a definição dos equipamentos e materiais necessários para a ocorrência e quais  profissionais e instituições devem ser acionados em cada caso.

No material, as espécies foram identificadas com os nomes populares e científicos propostos pelo Comitê Brasileiro de Registros Ornitológicos (CRBIO), mas houve a adição de outros nomes científicos e comuns pelos quais as espécies são conhecidas, a fim de auxiliar no reconhecimento em campo. As espécies principais foram separadas nas cores verde, amarelo e vermelho, de acordo com o grau de dificuldade na identificação:

Abaixo da fotografia de cada espécie, há uma barra retangular preta, com informações sobre o o diâmetro da anilha indicada (de acordo com o IBAMA), a incidência da ave em lista de extinção (dentro de um bloco de notas), o tamanho médio em centímetros (medido do bico à cauda) e o sexo da ave fotografada.

 

Exemplos das categorias “fácil”, “média” e “difícil” no guia são as espécies tiê-sangue (Ramphocelus bresilius), papagaio-da-cara-roxa (Amazona brasiliensis) e a fêmea da araponga (Procnias nudicollis) , respectivamente. A araponga é um exemplo de como a dificuldade da identificação pode variar dentro de uma mesma espécie – ao contrário da fêmea, o macho possui uma coloração marcante, com o corpo todo branco e a face e garganta em tom de verde-jade.

A Importância da Diversidade de Aves 

 A diversidade de aves no Brasil não é apenas um “tesouro natural”, mas também desempenha um papel vital nos ecossistemas: as aves atuam como polinizadoras, controladoras de pragas, dispersoras de sementes e indicadores da saúde ambiental. Portanto, a perda de aves, intensificada pelo tráfico de animais silvestres, leva a desequilíbrios ecológicos significativos, afetando outras espécies e a qualidade de vida dos seres humanos.

O tráfico de aves é um dos maiores desafios para a conservação da fauna brasileira. Espécies icônicas, como o canário-da-terra (Sicalis flaveola) e o papagaio-verdadeiro (Amazona aestiva) estão entre as mais visadas. Essas aves são capturadas de seus habitats naturais e vendidas ilegalmente, muitas vezes enfrentando condições de transporte e cativeiro cruéis.  O combate ao tráfico de aves exige uma abordagem integrada, envolvendo a colaboração entre várias instituições, incluindo órgãos governamentais, ONGs, universidades e a sociedade civil.

Educação e conscientização são componentes essenciais na luta contra o tráfico de aves. Nesse sentido, o guia não só serve como uma ferramenta técnica, mas também como um recurso educativo, aumentando a conscientização sobre a importância da proteção das aves e dos ecossistemas brasileiros. 

Uma atividade aliada à conservação é a observação de aves, conhecida como  “passarinhada” (birdwatching), que além de estimular o contato dos seres humanos com os ambientes naturais, é uma forma de incentivar a valorização da fauna em vida livre. As atividades de birdwatching podem ser realizadas também em centros urbanos, sendo uma atividade importante para gerar conexão e pertencimento com os espaços públicos da cidade.